Para esse encontro estivemos imbuídos de compreender as posturas espistemológicas da pesquisa qualitativa. Partimos do ponto destacado por Schwadt de que a Investigação qualitativa é uma denominação relativamente recente, datado de 1970 no meio acadêmico, esse movimento surge de um posicionamento crítico ao paradigma defendido até então, o positivimo.
A partir de críticas epistemológicas, ontológicas e metodológicas, o movimento da pesquisa qualitativa passa a construir seu próprio paradigma. Passando, sobretudo, a defender a compreensão de um fenômeno a partir da manifestação do sujeito, considerando a realidade a partir do olhar dos sujeitos, e não considerando essa realidade como fruto de observação passiva do pesquisador.
Considerando a combinação dos diferentes textos lidos e trabalhados em sala de aula, estabeleço como marcos discursivos:
1 - Conhecer as principais teorias que embasam a pesquisa qualitativa;
2 - Destacar as singularidades e semelhanças dessas teorias;
3 - Compreender as diferenças entre positivismo e construtivismo;
4 - Considerar a relação entre as pesquisas feministas e essa abordagem qualitativa;
Com base na classificação indicada por Flick (2009) há três posturas básicas da pesquisa qualitativa: Interacionismo Simbólico; Etnometodologia; e Estruturalista ou Pscicanalista.
1 - Interacionismo Simbólico
Essa postura foi desenvolvida a partir da tradição filosófica do pragmatismo norte-americano, advida da Escola de Chicago. Em termos gerais, trata-se de uma postura onde o significado do fenômeno parte da subjetividade atribuída pelos indivíduos e suas atividades cotidianas.
Esse termo foi cunhado por Blumer (1938), quando ele estabeleceu três premissas básicas: i) os seres humanos agem de acordo com o significado que as coisas tem para eles; ii) esse significado origina-se ou resulta da interação entre os indivíduos; e iii) esses significados podem ser controlados em um processo interpretativo e modificados pela pessoa ao longo do tempo para lidar com as coisas com as quais se depara.
Em suma, no interacionismo simbólico os pesquisadores precisam enxergar o mundo do ponto de vista dos sujeitos
2) Etnometodologia
Nessa postura, a compreensão do fenômeno está na análise dos métodos empregados pelos sujeitos para produzir a realidade existente, ou seja, na compreensão dos padrões de interação entre os indivíduos, padrões esses que são visivelmente racionais e explicáveis diante do cotidiano das pessoas. Ela tem como fundador Harold Garfinkel (1967), e como premissas a ideia de que a interação organiza-se estruturalmente; moldam e são moldadas pelo contexto; e que nenhum detalhe dessa interação pode ser descartado. A ênfase encontra-se nos processos de comunicação dessa interação.
Assim, o foco não é o significado subjetivo do indivíduo, mas o modo como essa interação é organizada. E para se abster de interpretação a priori, o pesquisador busca uma postura de indiferença etnometodológica, uma vez que a compreensão está no entendimento do contexto no qual o sujeito está inserido.
3) Modelos Estruturalista
A palavra principal que destaca essa postura é cultura. Nesse modelo as estruturas profundas não são acessíveis às reflexões individuais, elas estão latentes e contidas nos modelos culturais de uma sociedade. Por isso que são melhor estudadas pela psicanálise que busca compreender esses inconscientes e a forma como eles influenciam o indivíduo. Compreendem, por exemplo, os inconscientes coletivos, os quais não podem ser percebidos pelo individuo.
A proximidade entre as premissas dificultou, no primeiro momento, a compreensão das singularidades e semelhanças entre essas posturas. Para sanar essa dúvida, busquei em blogs com linguagem mais objetiva, as origens dessa postura, a formação dos autores que a postularam e outras formulações das premissas (Referências no final do texto)
Como resultado verifiquei que a grande semelhança entre elas é que a compreensão do fenômeno se dá a partir dos estudos sobre o contexto no qual o indivíduo está inserido. E as diferenças começam quando se pretende entender o ponto de origem dos significados. Como o interacionismo simbólico surge da psicologia social, com o filósofo e cientista social Georg Herbert Mead (1863 - 1931), e se desenvolve na década de 1930 com Blumer, apreendi que a necessidade naquele momento era de atribuir ao sujeito o significado dos fenômenos. A realidade não seria mais algo dado e passível somente de observação, mas algo mutável a partir do significado que os indivíduos davam para a realidade.
A premissa dois diz que esses significados surgem na interação entre os indivíduos, mas esse surgimento na interação se dá num processo dialético entre os indivíduos, que constroem os grupos e as coletividades, que por sua vez interferem na conduta do indivíduo.
Na minha pesquisa, verifiquei que esse posicionamento do interacionismo simbólico é contrário às ideias sociológicas totalizantes, como o funcionalismo, que admitia que as relações e ações sociais eram derivadas de normas e regras sociais pre-estabelecidas.
Porém com a Etnometodologia, a origem desses significados está na interação entre os sujeitos. Ainda que Heritage (1985) afirme a importância do contexto nas relações de interação, fica evidente que esse contexto ocupa um lugar de passividade diante da interação entre os sujeitos, na postura etnometodologista.
Já para os modelos estruturalistas, a ordem social, a estrutura latente e os aspectos culturais são os principais indutores para explicar a origem dos significados das coisas.
Compreendo a existência de uma ordem social dinâmica entre essas três posturas, e que elas são complementares para explicar os significados sociais. Destacar uma delas para realizar uma pesquisa, pode ser compreensível metodologicamente, mas insuficiente para entender a realidade social e como os sujeitos se relacionam. Conforme afirma Flick, a origem do entendimento dos significados pode estar em cada um dessas três posturas (no indivíduo, na interação ou na cultura), e complemento, essa origem pode se dá na relação entre as três. O significado de um fenômeno pode surgir numa relação dialética entre indivíduo, enquanto ser coletivo e interativo, e a realidade cultural a qual ele está inserido.
No livro de Schwadt (2006), pode-se compreender das três posturas epistemológicas - interpretativismo; hermenêutica e construtivismo social - a relação entre o sujeito e o objeto que ele quer pesquisar.
No interpretativismo, o sujeito observa o fenômeno e busca não interferir no mesmo. para melhor compreensão, relacionei esse conceito com a indiferença etnometodológica (FLICK, 2009), com a redução fenomenológica (no artigo de Maisonnave, 2008) e com o termo epoché (grego, que significa suspensao de juízo). Um exemplo disso capto da ideia radical de Teoria Fundamentada, que propõe a ausência de leitura prévia, para evitar conceitos preconcebidos.
Entretanto, após discussão em sala de aula, destaco dois tipos de posicionamentos diante o fenômeno pesquisado. Um deles é quando o pesquisador se fecha nos seus conceitos e parte para a interpretação do fenômeno sem permiti-lo que se manifeste diferente de seus preconceitos, isso é nocivo para a pesquisa qualitativa. Porém, quando o pesquisador se "alimenta" de conhecimento, admite conceitos, constrói seu referencial teórico de partida, mas permite que a realidade se mostre de maneira diferente, e esse pesquisador constrói seus postulados a partir da realidade que encontra, independente dos conceitos preconcebidos, o interpretativismo não foi prejudicado.
Na hermenêutica filosófica, aprendi que o sujeito não deve fazer esforço para se afastar do objeto analisado, como uma fuga total da realidade. Pois o sujeito, enquanto ser pensante, pode refletir o mundo que vive sem precisar sair desse mundo. A compreensão é uma interpretação, e portanto, não é uma atividade isolada, ela é fruto de nossas experiências.
A terceira postura epistemológica chama-se construcionismo, para eles a realidade não é fixa, passivamente observada. Eles nem afirmam nem negam o mundo lá fora, mas também discordam que o mundo só pode ser descoberto independentemente do intérprete. Durante o texto, Schwadt vai caracterizar o construcionismo como fraco ou forte.
O Construcionismo Fraco, explicado por Longino (1990), defende que o mundo real restringe nossa construção do conhecimento, assim, o pesquisador não constrói conhecimento totalmente desincorporado da realidade, para ele é preciso ter um "empirismo contextual", os elementos do contexto influenciam a realidade e passam a interferir na formulação de conceitos, hipóteses para explicar a realidade.
O Construcionismo Forte, defendido por Denzin (1997), argumenta que as formas de vida estão delineados por uma linguagem propriamente dos indivíduos, e que é possível produzir representações reais do mundo que traçam fielmente a realidade.
As dicotomias teóricas sempre me incomodaram. Repito, é necessário que o pesquisador escolha sua lente de observação do mundo, mas atribuir que uma postura espistemológica é a melhor ou a única para se compreender a realidade é ingenuidade científica. Assim, procurei um texto que relativizasse esses conceitos e encontrei o de Bresser-Pereira (2008), chamado "A verdade e seus objetos". Nele o autor chama atenção para o fato de o pós-modernismo, no afã de desconstruir as verdades colocadas pelo positivimo - através dos métodos indutivo-dedutivo, hipotético dedutivo - lançou mão das verdades simples e abarcou o relativismo.
Pois bem, o autor afirma que apesar do relativismo ter se espalhado, a verdade e a confiabilidade continuam sendo necessidade do ser humano, não só para o desenvolvimento científico e tecnológico, mas também das próprias relações sociais.
De um lado temos os que negam as verdades, até mesmo as mais simples, e de outro os que aceitam as verdade simples, mas se acomodam nessas verdades e negam a existência de outras interpretações de realidades mais complexas, afirma Bresser.
Digo isso para "relativizar o relativismo", e por sua vez os postulados do construcionismo (sobretudo o construcionismo "forte" ou "radical"). Ainda que a realidade das relações complexas possam ser interpretadas de diferentes formas, há conceitos que consensualmente acordados e, portanto, verdades para aquele contexto.
Fica como aprendizagem dessa aula a necessidade de se assumir, dentro da pesquisa qualitativa, as lentes de observação da realidade, não como the best one, mas como uma escolha particular do sujeito em relação ao objeto analisado, no contexto específico. Tanto o positivismo quanto o interpretativismo podem ser lentes de compreensão do fenômeno, eles não são antagônicos, dicotômicos, mas duas formas diferentes de se chegar à compreensão do mesmo fenômeno, ainda que dê respostas diferentes.
1- BRESSER PREREIRA, L. C. A
verdade e seus objetos . ( acesso ao site www.bresserpereira.org.br em 24/2/2010)
*FLICK, Uwe. Introdução à pesquisa qualitativa. 3ª ed. Tradução Joice Elias Costa. Porto Alegre: Artmed, 2009 [Capítulos 6].
*SCHWANDT, T. Três posturas epistemológicas para a investigação qualitativa: interpretativismo, hermenêutica e construcionismo social. In: DENZIN, N. K., LINCOLN, Y. S. e colaboradores. O planejamento da pesquisa qualitativa: teorias e abordagens, Porto Alegre, Bookman e Artmed, 2006, Cap. 7, p. 193-217.
VERGARA, Sylvia C.; CALDAS, Miguel P. Paradigma interpretacionista: a busca da superação do objetivismo funcionalista nos anos 1980 e 1990, Revista de Administração de Empresas - RAE, v. 45, n.4, out/dez 2005, p. 66-72.
WEBER, R. Editor’s Comments - the rhetoric of positivism versus interpretivism: a person view. MIS Quarterly, v. 28, n. 1, p. iii-xii, March 2004.
http://www.cafecomsociologia.com/2012/09/goffman-e-o-interacionismo-simbolico.html
http://louisecomunicacao.blogspot.com.br/2010/11/interacionismo-simbolico.html
http://educacao.uol.com.br/disciplinas/sociologia/interacionismo-simbolico---fundamentos-blumer-e-o-estudo-das-interacoes-sociais.htm
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