Uma vez que conversamos elementos importantes da coleta de dados, ressaltamos aqui uma preocupação que deve ser constante na pesquisa qualitativa - a documentação dos dados. Mas o que isso significa? A documentação constante dos dados quer dizer o cuidado que o pesquisador deve ter em registrar sempre as informações, tanto os dados coletados quanto as reflexões e relações contextuais.
No capítulo 22 de Flick (2009), ele afirma que nas observações a tarefa principal é documentação das ações e das interações como forma de enriquecimento contextual. Isso vem ser importante para que na análise posterior dos dados, o pesquisador possa realizar as relações teóricas e fundamentar suas generalizações. O processo de documentação consiste em três etapas:
Gravar propriamente dito requer cuidados técnicos, o que pode ser feito com celular (modernos como os atuais), porém eu recomendaria o uso de gravador próprio para esse fim, pois isso minimiza as possibilidades de imprevistos situacionais.
Em seguida, a transcrição, que pode ser total, captando os humores e interjeições, quando, por exemplo se quer fazer uma análise de discurso; ou uma transcrição seletiva, quando se quer apenas uma análise de conteúdo. É importante definir as convenções da transcrições como seus símbolos e códigos das reações dos entrevistados, conforme aponta Drew (1995) em Flick:
E por fim, a construção de uma nova realidade, o que a meu ver melhor deveria ser chamada de "(re)construção". Essa etapa foi bastante destacada em sala de aula como o grande trunfo da pesquisa qualitativa e vantagens de registros documentais constantes. A essa reconstrução da realidade com o uso de textos, Flick chama de: a Realidade como Texto: o Texto como nova realidade.
Estamos nos formando enquanto pesquisadores para compreender a realidade e poder contribuir de alguma forma para sua melhoria. Logo, é mister pensar que ao fim de um trabalho sejamos capazes de reconstruir uma realidade apontando novas formas de convivência social, para tanto, o uso de registros documentais ensejará uma melhor rememoração das reflexões e relações contextuais surgidas no ato da coleta de dados. Eu acrescentaria dizendo que esse registro é fundamental em todas as fases da pesquisa.
Um debate que proporcionou boas reflexões em sala foi quanto à possibilidade de perda de naturalidade com o uso de gravadores. Os entrevistados, por vezes, podem reclamar de timidez diante aparelhos gravadores. Um dos alunos falou que em sua pesquisa teve que dispensar o uso desses aparelhos porque o entrevistado alegou certa fobia e que não faria a entrevista com gravadores.
Claro que esse caso é uma exceção, mas em geral o pesquisador tem o dever de conduzir a entrevista tentando tranquilizar os respondentes diante o uso de gravações, além de registrar os cuidados éticos com os dados coletados. Os primeiro minutos de tensão podem ser aliviados com perguntas genéricas e abertas, e em seguida com os entrevistados mais à vontade, inserir perguntas mais diretivas.
Flick salienta dois tipos de registros documentais: Notas de Campo e Diário de Pesquisa.
Na primeira, fazemos um registro de conclusões feitas após cada contato individual de campo. Isso é fundamental para o que dissemos antes, rememorar as reflexões no ato da generalização teórica final, mas também importantíssimo para quem deseja trabalhar com a Teoria Fundamentada, que exige circularidade em todas as fases. O uso do diário de pesquisa abrange todas as fases, registra os fatos, reflexões, contextos, dificuldades, conclusões parciais desde a formulação inicial da pesquisa até as fases conclusivas.
Realizar o registro das atividades de campo na pesquisa qualitativa proporciona ao pesquisador maior proximidade com o contexto do fenômeno investigado, para isso, existem técnicas e cuidados, que uma vez obedecidas leva o sujeito a compreender melhor a realidade investigada. Isso permite reconstruir sua gestalt a fim de analisá-la, fragmentá-la, sintetizar e propor novos significados.
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